Mal tomou posse e o governador do Espírito Santo, Paulo Hartung (PMDB), programou uma série de visitas a Brasília para tentar convênios com ministérios – e conferir o andamento dos atuais, fechados pelo governo antecessor. Os capixabas passam por um momento crítico desde alguns anos atrás, quando perderam o Fundap, abastecido pelo ICMS diferenciado para importação que reforçava os cofres do Estado.
O cenário desandou durante uma gestão esforçada, mas infeliz do antecessor Renato Casagrande (PSB) – apoiado e lançado pelo próprio Hartung em 2010. Casagrande, vindo de carreira brilhante e em ascensão no legislativo – foi deputado e senador, saiu encorajado do gabinete em Brasília para o Palácio Anchieta (Numa tarde do início de 2010 no gabinete do Senado o repórter o encontrou animado com equipe enumerando as metas para cada setor, ciente da iminente vitória).
Mas no cargo enfrentou os mais variados problemas. Montou um time criticado até por aliados, veladamente, e encarou a pior crise de caixa com a perda das receitas. O Tesouro prometeu R$ 3,5 bilhões para compensar a perda do Fundap, a granel. O atual governador concentra-se numa equação paradoxal com um Orçamento apertado: segurar as contas e também investir.
Enquanto Casagrande se contorcia para não perder apoio popular, perdia apoio político discretamente. Afastado do Poder desde que deixou o governo, o economista Hartung submergiu. Mergulhou os quatro anos em estudos meticulosos de números da Economia do País e em especial do Estado; mesmo longe, avaliou de perto cada passo do governo de Casagrande, mapeando avanços e entraves. Ministrou aulas em faculdade e rodou o Brasil como palestrante convidado (tornou-se um cidadão comum, circulava de mochila e calça jeans, mostrou assim desapego ao Poder e ganhou simpatia).
Deste modo, quieto, Hartung redescobriu um Espírito Santo em letargia político-econômica, e de seu bunker (em diálogo constante até com alguns membros do Governo) elencou metas, e para surpresa do aliado no cargo anunciou-se postulante novamente ao Palácio. Até conquistar a vaga pela terceira vez, uma moqueca eleitoral foi servida na campanha com ataques mútuos (inclusive pessoais) entre os dois principais candidatos, outrora amigos e aliados.
Vencedor, PH – ou Imperador, como é chamado por aliados e desafetos nos bastidores pela peculiaridade que imprimiu no Executivo, com marca de competente centralizador – agora parte para uma maratona de encontros com empresários, governadores e União para reinserir o Espírito Santo no cenário nacional.
Conseguiu um time partidário de peso para suas incursões, em companhia da senadora eleita Rose de Freitas, do senador Ricardo Ferraço, e do deputado federal Lelo Coimba – todos do PMDB como ele. A despeito da força-tarefa, Hartung tem know-how para viradas. Suas duas gestões no Palácio Anchieta foram notabilizadas nacionalmente pelo equilíbrio das contas públicas e retomada de investimentos em variados setores, elevando o PIB capixaba. Em especial, destacou-se também pela queda dos índices de criminalidade na grande Vitória.
Hartung tem garantido a aliados e publicamente que não vai se candidatar à reeleição em 2018. Especula-se que seu indicado natural será Ferraço, preterido por Casagrande em 2010, ajudado pela conjuntura política. Os próximos anos mostrarão se o Imperador capixaba terá fôlego para esse desafio de rearranjo local, ou se o Estado continuará à deriva nesse mar de recessão nacional.
O ex-governador, que saiu ferido do combate e se dizendo traído, assumiu a presidência da Fundação João Mangabeira, do PSB, e viaja o País para unificar o partido para 2018. Casagrande é pule de dez para disputar a prefeitura de Vitória ano que vem, e com chances. Tão competente quanto Hartung, faltou-lhe sorte no cargo e a experiência no Executivo que o ex-padrinho teve. Criador e criatura, Hartung e Casagrande podem se reencontrar numa eventual disputa em 2018 para o Palácio – é cedo para cravar que Hartung não será candidato, e muita moqueca será servida nas mesas do Poder.