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Brasília - 1 de abril de 2025 - 17:58h

IHG-DF retira exposição sobre mulheres pioneiras e causa polêmica na entidade

Foto: Divulgação/IHG-DF
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Por Carol Purificação, repórter da Coluna

Os arquivos de fotos, documentos e até roupas da exposição “Memórias Femininas da Construção de Brasília”, da pesquisadora Tânia Fontenele, há três anos na sede do Instituto Histórico e Geográfico do DF, foram retirados por ordem da direção. 

Isso gerou críticas veladas de alguns acadêmicos, principalmente pelo fato ter ocorrido no mês das mulheres e na véspera da comemoração dos 65 anos da Capital, em abril. Paulo Castelo Branco, presidente do IHG-DF, diz que a exposição era temporária, e que a realocação foi consentida com a pesquisadora.

Em nota à Coluna, o presidente do IHG-DF informou: “A exposição da Tânia Fontenele era para ficar um mês e estava há quase três anos no nosso Museu, onde hoje estamos fazendo obras. Pedimos para a Tânia retirar e ela concordou. O Instituto pagou pela remoção, que foi realizada na presença dela. E nenhum dano foi causado”.

Paulo salienta ainda que as exposições que continuam no local são permanentes e pertencem à história de Brasília.

Internamente, a acadêmica Leiliane Cristina Lopes Rebouças soltou a seguinte nota de repúdio:

Nota de Repúdio à Retirada do Acervo da Exposição “Memórias Femininas da Construção de Brasília” do Museu do IHG-DF

A exposição “Memórias Femininas da Construção de Brasília” representou um marco fundamental na celebração e reconhecimento do papel essencial desempenhado pelas mulheres na edificação de Brasília, no Museu do Instituto Histórico e Geográfico do Distrito Federal. A mostra, que ocorria desde 2023, constituiu um tributo àquelas pioneiras que chegaram à cidade em seus primórdios, entre 1958 e 1960, e que, através de diversas profissões como parteiras, lavadeiras, cozinheiras, professoras e até mesmo engenheiras, contribuíram significativamente para a construção da nova capital.

A iniciativa, coordenada e com curadoria da cineasta e pesquisadora de gênero Tânia Fontenele, teve como principal objetivo promover a preservação e a valorização da trajetória dessas mulheres, cujas histórias foram frequentemente negligenciadas na historiografia oficial da cidade. A própria existência da exposição demonstra um esforço contínuo em trazer à luz essas narrativas, como evidenciado por mostras anteriores, a exemplo daquela ocorrida na Faculdade de Educação (FE) da Universidade de Brasília (UnB) em novembro de 2022. 

A recorrência de iniciativas com esta temática sinaliza um movimento importante para reconhecer a participação feminina na história de Brasília, o que torna a preservação dos materiais utilizados nessas exposições de suma importância.

Diante deste contexto, manifestamos nosso veemente repúdio à decisão de retirar o acervo da exposição “Memórias Femininas da Construção de Brasília” do Museu do IHG-DF, no Mês da Mulher e às vésperas dos 65 anos de Brasília, sem que os acadêmicos e a diretoria fossem consultados.

Expressamos profunda preocupação e descontentamento com esta ação, cujas motivações não foram devidamente esclarecidas para os acadêmicos e acadêmicas. O acervo desta exposição possui um valor inestimável para a memória coletiva de Brasília e do Brasil, pois representa um conjunto de documentos históricos, objetos raros e imagens da década de 1960 que transportaram o público para os primeiros anos da capital e não pode simplesmente ir parar numa garagem qualquer. 

A ausência de informações detalhadas sobre a razão específica para a remoção do acervo levanta questionamentos sobre a transparência , democracia e a responsabilidade na gestão de patrimônio cultural.

Reconhecer e preservar as histórias das mulheres que contribuíram para a construção de Brasília é de fundamental importância para uma compreensão completa e fidedigna da história da cidade. As pioneiras desempenharam papeis cruciais em diversas áreas, desde os serviços básicos até as profissões técnicas. A exposição buscou dar voz àquelas que, como afirmou Tânia Fontenele, muitas vezes não se consideravam importantes para a história, apesar de terem sido protagonistas de um momento único.

A participação das mulheres na construção de Brasília foi, por muito tempo, invisibilizada.  A exposição “Memórias Femininas” atuou precisamente para corrigir essa lacuna histórica, promovendo a valorização da trajetória dessas pioneiras . Ao exibir documentos históricos, objetos raros e imagens, a exposição proporcionou ao público um contato direto com o passado, estimulando a memória e o reconhecimento de um grupo historicamente marginalizado. 

A retirada do acervo da exposição acarreta diversas implicações negativas. Primeiramente, há a perda do acesso público a documentos, objetos e narrativas que ilustram a vida e o trabalho dessas mulheres. O acervo, composto por documentos históricos, objetos raros e imagens da década de 1960, possui um valor intrínseco para pesquisadores, educadores e para o público em geral interessado na história de Brasília e nos estudos de gênero. 

A sua remoção limita as oportunidades de aprendizado e de engajamento com essa importante parte da história brasileira. Em segundo lugar, essa ação impacta negativamente o reconhecimento da história das mulheres em Brasília. Mesmo após mais de seis décadas da fundação da capital, as vozes femininas ainda lutam por protagonismo na narrativa histórica da cidade. Iniciativas como esta exposição são cruciais para alcançar a igualdade de gênero nas narrativas históricas, e a remoção do acervo pode ser interpretada como um retrocesso nesse processo. 

Por fim, a retirada do acervo afeta a preservação da memória cultural da cidade. A exposição estava intrinsecamente ligada à ideia de memória coletiva e à importância de reconhecer contribuições previamente ignoradas. A remoção do acervo contradiz diretamente esse objetivo fundamental.

Fazemos um chamado urgente à Diretoria do IHG-DF e ao Presidente do Instituto Histórico e Geográfico do DF, Dr. Paulo Castelo Branco para que reconsidere a decisão de remover o acervo da exposição “Memórias Femininas da Construção de Brasília”. 

No mínimo, exigimos um esclarecimento público sobre os motivos que levaram a essa ação e qual será o destino futuro deste importante material histórico. É imprescindível valorizar e proteger iniciativas que resgatam e celebram a história de grupos historicamente marginalizados. 

A remoção desse acervo pode ser interpretada como uma desvalorização simbólica das contribuições dessas mulheres, transmitindo uma mensagem negativa sobre quais histórias são consideradas relevantes e dignas de preservação. É fundamental que a memória da construção de Brasília seja contada em sua totalidade, reconhecendo o papel fundamental de todos os seus atores, incluindo as mulheres que, com seu trabalho e dedicação, ajudaram a moldar a capital do país.

Pelos motivos acima expostos, nós mulheres acadêmicas do Instituto Histórico e Geográfico do DF (IHG-DF) assinamos essa nota de Repúdio.

Leiliane Cristina Lopes Rebouças

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